Este artigo foi elaborado por um jornalista com mais de 15 anos de experiência na cobertura de saúde e ciência, buscando traduzir o jargão médico para o leitor comum e investigar o que realmente importa para o cidadão por trás dos grandes eventos do setor.
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O palco está montado, mas a peça é sobre o quê?
Todo ano é a mesma coisa. Grandes centros de convenções, crachás pendurados, um batalhão de médicos e a indústria farmacêutica em seu habitat natural. Em 2025, o espetáculo da vez será o Congresso Brasileiro de Angiologia e de Cirurgia Vascular, o famoso SBACV. O nome é complicado, a especialidade, mais ainda. Mas no fim das contas, o que se discute ali dentro, naqueles corredores com ar-condicionado, vai muito além de um simples encontro de especialistas. É sobre a saúde das suas veias e artérias. É sobre a sua vida.
Como jornalista que já rodou por muitos desses eventos, aprendi a olhar além dos coquetéis e dos estandes coloridos. O verdadeiro pulso do congresso não está nos discursos ensaiados, mas nas entrelinhas, nas conversas de café e nas perguntas que muitos evitam fazer em voz alta. E a principal delas é: para quem é toda essa inovação?
A vitrine tecnológica e o desafio do mundo real
A pauta do SBACV 2025, pode apostar, virá recheada de promessas. Falarão de cirurgias robóticas, de cateteres que navegam pelo corpo com a precisão de um GPS e de novos medicamentos que prometem dissolver coágulos perigosos. É o futuro, e ele é fascinante.
“A gente fica maravilhado, claro. Ver uma técnica nova, minimamente invasiva, que coloca o paciente de pé no dia seguinte… é uma revolução”, me contou certa vez uma jovem residente, com os olhos brilhando. É a empolgação genuína de quem quer o melhor para o doente.
O problema é que o Brasil não cabe num centro de convenções. A poucos quilômetros dali, a realidade é outra. É a do posto de saúde com fila de espera, do hospital público que luta por insumos básicos.
É o que um cirurgião veterano, com quem conversei num congresso passado, resumiu de forma seca: “Bonito no papel. Mas esse laser para tratar varizes, esse stent de última geração… quando isso chega para a dona Maria, que depende do SUS? Esse é o debate que importa”.
O abismo entre a medicina de ponta e o acesso universal é o elefante na sala. Para deixar claro o tamanho do fosso, vamos colocar na ponta do lápis:
Técnicas para Varizes: O Velho e o Novo
Característica | Cirurgia Convencional (Safectomia) | Técnicas Modernas (Laser/Espuma) |
---|---|---|
Cortes | Sim, na virilha e perna | Não, apenas punções com agulha |
Anestesia | Geral ou raquidiana | Local, na maioria das vezes |
Recuperação | Lenta, com repouso de semanas | Rápida, retorno às atividades em dias |
Disponibilidade no SUS | Ampla | Restrita ou inexistente em muitas regiões |
A tabela não mente. A inovação existe, mas ela custa caro. E a conta, por enquanto, não fecha para a maioria da população.
O que mais estará na mesa de discussão?
O congresso da SBACV é um termômetro para os maiores desafios da saúde vascular. Não se trata apenas de estética. As doenças circulatórias matam e incapacitam. Espera-se que os debates se aprofundem em temas críticos:
- Trombose Venosa Profunda: Um problema de saúde pública, com números que preocupam, especialmente com as possíveis sequelas vasculares pós-pandemia. A busca é por diagnóstico rápido e tratamento eficaz para evitar a embolia pulmonar, que pode ser fatal.
- Pé Diabético: Uma consequência devastadora do diabetes descontrolado. As discussões devem girar em torno da prevenção, dos cuidados multidisciplinares e das técnicas para evitar amputações, que ainda são uma realidade trágica no país.
- Aneurisma de Aorta: Uma bomba-relógio silenciosa. O foco é o rastreamento em grupos de risco e o avanço das cirurgias endovasculares, menos agressivas que o método tradicional de “barriga aberta”.
- Doença Arterial Obstrutiva Periférica (DAOP): Ligada diretamente ao tabagismo e ao colesterol alto, causa dores terríveis ao caminhar e pode levar à perda de membros. Como conscientizar a população? Como tratar de forma mais eficiente?
Cada um desses tópicos representa milhares de brasileiros em sofrimento. O que for decidido ali, as diretrizes que forem atualizadas, pode, eventualmente, mudar a forma como esses pacientes são tratados.
Pode.
O SBACV 2025 será, sem dúvida, um evento de peso para a comunidade médica. Um palco de conhecimento e de reencontros. Mas para o cidadão comum, o verdadeiro sucesso do congresso não será medido pelo número de participantes ou pela qualidade dos palestrantes. Será medido nos anos seguintes, na fila do posto de saúde, na velocidade de um diagnóstico, na chance de receber um tratamento que hoje parece coisa de outro mundo. A ciência avança rápido. O desafio, como sempre, é fazer com que a dignidade chegue na mesma velocidade.
Perguntas Frequentes (FAQ)
O que é a SBACV?
A SBACV é a Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular. É a entidade que representa os médicos especialistas em doenças das artérias, veias e vasos linfáticos no Brasil. Ela promove eventos, como o congresso anual, e ajuda a definir as melhores práticas para o tratamento dessas condições.
Por que um congresso de médicos é importante para mim, que sou paciente?
É neste tipo de evento que as últimas novidades em tratamentos, diagnósticos e tecnologias são apresentadas e debatidas. As diretrizes médicas, ou seja, as “regras” de como tratar certas doenças, são atualizadas com base nessas discussões. O que se decide em um congresso hoje pode mudar o seu tratamento amanhã.
O que faz um médico angiologista ou cirurgião vascular?
É o especialista que cuida de tudo relacionado à circulação. Isso inclui desde problemas mais conhecidos, como varizes e vasinhos, até doenças graves como trombose, aneurismas, e obstruções nas artérias que podem causar dor, feridas e até amputações. Se você tem problemas de circulação, é a ele que você deve procurar.
As novas tecnologias apresentadas nesses congressos chegam ao SUS?
Essa é a questão central. Muitas tecnologias, por terem um custo elevado de equipamento e treinamento, demoram a ser incorporadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Elas geralmente chegam primeiro à rede privada. A luta de entidades médicas e da sociedade civil é justamente para ampliar o acesso e fazer com que essas inovações beneficiem a todos, mas é um processo lento e complexo.
Fonte de referência para a especialidade: UOL VivaBem Saúde