CBEV 2025: O Futuro Elétrico do Brasil Entre Promessas e a Dura Realidade

O cheiro de novidade paira no ar quando o assunto é carro elétrico. Mas, como jornalista calejado, aprendi a farejar a diferença entre o marketing polido e a poeira da estrada. O Congresso Brasileiro do Veículo Elétrico (CBEV) 2025 se avizinha e, com ele, a promessa de um futuro mais verde, silencioso e, quem sabe, acessível. A questão é: estamos realmente prontos para essa revolução, ou ainda estamos patinando no básico?

O Brasil, uma nação de proporções continentais e desigualdades abissais, olha para a eletrificação da frota com uma mistura de otimismo forçado e ceticismo profundo. Enquanto o mundo desenvolvido acelera, com incentivos robustos e infraestrutura que avança a passos largos, por aqui a sensação é de que estamos sempre correndo atrás do prejuízo. O CBEV 2025 será, portanto, mais um termômetro para medir a febre da eletromobilidade em terras brasileiras. E, convenhamos, a temperatura anda morna.

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O Que Esperar do CBEV 2025: Entre a Promessa e a Realidade

Todo congresso é um palco para discursos grandiosos e projeções ambiciosas. O CBEV 2025 não será diferente. Espera-se que montadoras exibam seus mais recentes modelos, que empresas de tecnologia apresentem soluções de carregamento inovadoras e que o governo (ou seus representantes) reforce o compromisso com a sustentabilidade. Mas a gente, que está na rua, sabe que o buraco é mais embaixo.

O desafio não é apenas tecnológico; é logístico, econômico e, principalmente, de mentalidade. Ainda que a venda de veículos elétricos venha crescendo – e isso é inegável –, a base é pequena. Muito pequena. É como celebrar um crescimento de 50% em algo que antes era zero. Um belo número no papel, mas que na realidade do dia a dia mal se percebe.

A Eletromobilidade em Terreno Acidentado

O Brasil tem suas particularidades. As distâncias são brutais, as estradas, nem sempre um tapete. A rede elétrica, em muitos lugares, é um ponto de interrogação. Colocar um carro elétrico para rodar do Oiapoque ao Chuí exige mais do que uma tomada 220V. Exige uma infraestrutura capilar, confiável e barata. E é aí que a conversa desanda. A ansiedade de autonomia, o famoso “range anxiety”, não é um problema só do consumidor; é do próprio sistema que ainda não se garantiu.

E tem o custo. Ah, o custo. Na padaria, nas filas dos bancos, o assunto é sempre o mesmo: o dinheiro que parece encolher a cada dia. Um carro elétrico novo, para a maioria dos brasileiros, ainda é um luxo inatingível. Fala-se em redução de impostos, em incentivos à produção local. Tudo muito bonito na teoria. Mas na prática, o preço ainda é proibitivo. A conta não fecha.

Números Falam Por Si (Ou Seriam Apenas Sussurros?)

Sim, o mercado de veículos elétricos e híbridos no Brasil tem mostrado um crescimento constante. Em 2023, vimos um salto considerável. Mas vamos colocar isso em perspectiva. A frota total de veículos no país é gigantesca. O percentual de eletrificados ainda é uma agulha no palheiro.

Veja bem alguns números para ilustrar o cenário atual e a projeção que o CBEV 2025 deve reforçar:

Ano Vendas de Eletrificados (Aprox.) % da Frota Total (Estimativa)
2022 49.000 unidades 0,04%
2023 94.000 unidades 0,08%
Projeção 2025 150.000 – 200.000 unidades 0,15%

Os números, por mais que cresçam em volume, ainda representam uma fatia minúscula do mercado total. Isso mostra que, apesar do entusiasmo, a adoção em massa ainda está longe de ser uma realidade palpável. O Brasil segue, no que tange a eletrificação, alguns passos atrás de potências automotivas como China, Estados Unidos e países europeus, onde os incentivos são mais agressivos e a infraestrutura, muito mais consolidada.

O Papel do Governo e da Indústria: Quem Paga a Conta?

O governo brasileiro tem sinalizado algumas intenções, como a desoneração de veículos eletrificados ou incentivos à produção de componentes. Mas é um balé lento. A indústria, por sua vez, está num dilema: investir pesado em algo que ainda tem demanda limitada ou esperar a demanda crescer para então investir? É o famoso ovo e a galinha. Quem dá o primeiro passo, e com qual perna, é a grande questão.

E a verdade é que o governo, com suas contas apertadas, não tem bala na agulha para bancar uma transição energética como as nações mais ricas. A conta, no fim das contas, sempre cairá no colo do consumidor, seja no preço final do carro, seja nos impostos indiretos que financiam qualquer benefício.

Infraestrutura: A Velha Questão da Tomada

Quantas vezes ouvimos a mesma ladainha sobre pontos de recarga? É a pedra no sapato da eletromobilidade. De que adianta ter um carro elétrico supermoderno se não há onde carregar? Ou, pior, se o ponto de recarga está quebrado, ocupado ou custa os olhos da cara?

A expansão da rede de carregamento é vital e complexa. Envolve investimentos de concessionárias de energia, empresas privadas, shoppings, condomínios. E a distribuição é caótica. Grandes centros urbanos têm mais pontos, mas o interior do país, que é a espinha dorsal do Brasil, fica a ver navios. Ou a pé.

Para o CBEV 2025, a pauta da infraestrutura deve ser central, com discussões sobre:

  • Padronização dos conectores (um eterno debate);
  • Modelos de negócio para eletropostos (públicos, privados, híbridos);
  • Rapidez no carregamento (o tempo é dinheiro, ou bateria);
  • Integração com a rede elétrica (será que ela aguenta o tranco?);
  • Incentivos fiscais para empresas que investem em infraestrutura.

O fato é que o desenvolvimento da infraestrutura de carregamento no Brasil ainda engatinha. É um desafio que exige coordenação de vários setores e um plano de longo prazo que, sinceramente, ainda não vimos de forma robusta.

O Consumidor Brasileiro: Entre o Sonho e o Bolso

“Olha, é… é complicado. A gente até sonha em ter um carro elétrico, mas o preço, né? E a bateria, como é que fica daqui a uns anos? E pra viajar, tem posto em todo lugar? Sei não, ainda me parece coisa de gringo”, desabafa Márcia, de 45 anos, vendedora de loja e usuária do transporte público, que se vê cada vez mais distante de um carro próprio, elétrico ou não.

A percepção de Márcia não é isolada. A preocupação com o custo de manutenção, a vida útil da bateria e a revenda são fatores que pesam na decisão. O mercado de seminovos eletrificados, incipiente, ainda não dá a segurança que o consumidor médio precisa para arriscar um investimento tão alto. Não basta que a tecnologia seja boa; ela precisa ser compreendida, confiável e, acima de tudo, acessível.

O Futuro Pós-CBEV 2025: A Estradinha é Longa, Mas Já Começamos a Andar?

O CBEV 2025 será, sem dúvida, um espaço importante para o debate, a troca de informações e o networking. Veremos, certamente, avanços tecnológicos e novas parcerias. Mas o desafio da eletromobilidade no Brasil vai muito além dos salões de congresso.

Ele reside na capacidade de transformar os discursos em políticas públicas eficazes, os protótipos em veículos acessíveis e os poucos pontos de recarga em uma rede robusta. O caminho é longo, sinuoso e cheio de obstáculos. A estradinha já começou a ser trilhada, sim. Mas ainda estamos muito longe de um passeio tranquilo. A verdade dos fatos é que, por enquanto, o carro elétrico no Brasil é uma promessa de futuro. Um futuro que, para a maioria, ainda está bem distante da garagem.

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